One more day... One more drink...
“Se eu vier correndo de braços abertos e sorrindo na sua direção, será que você irá sorrir de volta?”
XX
Ele decidiu morrer
Ele decidiu morrer. Tentei conversar e argumentar por algum momento, mas nada do que eu dizia parecia mudar seu pensamento. Naquele momento estávamos numa cidadezinha no interior. Pensava que aquilo era um reduto de felicidade e que nada mais iria importar. Contato com a natureza, longe dos agrotóxicos dos alimentos vendidos na grande cidade má. Que pra ser sincero não ficava muito distante dali. Bastava paciência e um tanque de gasolina. Ouvindo Jerry Lee Lewis a viagem ficava até mais curta, agora quando ele empombava que queria Alice in Chains, o caminho ficava cinza e chovia. Sempre chovia enquanto o vocalista de voz aguda gritava “Love, Hate, Love”. Tinha sua beleza, mas sempre achei má influência, justamente por causa daquela possibilidade sórdida que surgia. Depressão.
Foi uma palavra que tentamos evitar depois que ele passou pelos 15. Reclamava demais da escola e por mais que eu sempre fosse visitar (e eu ia apesar de ficar do lado de fora da sala assistindo tudo da janela) tudo parecia normal. Estupidamente normal. Então eu o visitava regularmente em casa mesmo. Conversava com ele enquanto brincava no chão ou escrevia num caderno velho. Ele nunca olhava para mim, mas as conversas eram agradáveis e eu sempre dizia que havia tempo pra tudo nessa vida.
Ele se mudou aos 22, depois de terminar a faculdade. Minhas visitas foram diminuindo pouco a pouco até se tornarem raras. Afinal, era um longo caminho cidade-campo e campo-cidade e eu tinha meus afazeres também. Estavam crescendo com uma velocidade absurda e isso até me irritava. Não mais do que as chamadas “doenças-modernas”. Todos os “ismos” e desculpas para falta de um bom sermão me deixavam apreensivo quanto ao futuro. Essa será a geração responsável pelo progresso social-científico-industrial-religioso-e-o-escambau?
Devo admitir que talvez (e só talvez) eu esteja ficando velho. Os dias passam rápido demais e não consigo lidar com essa velocidade de informação e tudo mais. Tudo era mais divertido na velha era. Ah! O velho mundo. Depois da peste negra, é claro. Tudo era tão azul. Tão belo. E eu admiro imensamente esse valor que é dado na natureza. Eu atribuo imenso valor do mesmo modo.
Acontece que Rubens era um garoto do futuro. Ele era sempre todo vidrado nessas coisas. Nesse papo teen, mas sem tanta besteira envolvida. E eu tentava ainda convencê-lo a ver as coisas boas na vida e a perceber que tudo o que desejamos pode ser alcançado. Ou pelo menos menti bastante ao garoto. Disse toda a falácia que me foi dita com o passar dos anos. Repeti muito do que ouvi em alguns pedidos de clemência. Só de lembrar quase caio da cadeira de tanto rir. Hilários. Ainda mais na cidade grande. São tantas desculpas e tanto papo furado. Dá medo às vezes, sabe? Mas é só aquele friozinho que chega à barriga e some um ou dez minutos depois. Nada para se preocupar. Nada mesmo.
Estava mais preocupado com Rubens. Em uma semana cinzenta e chuvosa de Abril, o que já não achei tão comum devido à região, ele estava mais triste que o normal. E veio com um papo que já tinha estado em uma torre da cidade grande, onde alguns desmiolados procuraram descobrir como voar e fracassaram epicamente. Na maioria das vezes a cidade inteira passava para ver seus corpos destruídos no asfalto como peças no museu. Achava aquilo meio absurdo e traumático, mas eles sempre chamaram de curiosidade, então não me ative a recriminações.
Fiz o que todo bom pai, ou amigo, ou conhecido com um mínimo de juízo faria. Quebrei um braço do garoto. Quebrei um braço de Rubens. Veja bem que não totalmente intencional. Eu só queria assustá-lo um pouco para que desse um pouco mais de valor à vida. Ele deveria aprender o tanto que, apesar de maldita e infeliz, ela deveria ser valorizada. Então, convidei-o de uma forma bem suave e educada e sair pela janela e escalar pelo teto da casa velha até uma parte onde era possível sentar e observar a vista, ao lado da antena de TV e de um símbolo estúpido de um galo. No símbolo do galo vinha escrito “Rooster”. O menino adorava. Sempre cantava sem saber direito o que significava. Boa música apesar do clima. Chovia toda a semana e aquele era um momento de trégua. Aproveitamos e fomos subindo de mansinho. Passamos pela janela e seguimos pisando telha a telha, mas eu tinha um trabalho aquela tarde. Puxei uma telha. Uma só. Ele pisou em falso e escorregou. Dava pra ver o medo nos olhos dele enquanto se arranhava pelas telhas tentando se agarrar a alguma coisa, antes dele cair eu o segurei.
Foi uma cena bem clichê, mas que se encaixou perfeitamente com meus propósitos. Ele se segurava firme a um dos meus braços e xingava sem parar. Muito nervoso. Comigo principalmente, porque acho que percebeu quando que eu movi a telha de lugar. Eu mandava que ficasse em silêncio.
- Droga! Droga! Maldito! Por que fez isso comigo? – Ele ainda gritava sem diminuir em nada o tom de sua voz.
- Preste bem atenção. Fique calado e ouça, porque não irei repetir. Quero que me responda. Responda com toda a sinceridade. Você ama sua vida?
- Que? Que pergunta é essa? Seu imbecil! Você pirou de vez, só pode! Você pirou... Caralho! – O último palavrão saiu com mais ênfase que os demais.
- Você não me respondeu – Disse ainda calmamente.
- Ok! Ok! Não me solta. Não me solta... Amo sim... Amo sim essa vida fudida do jeito que é...
- Hummm – Murmurei e esperei alguns segundo até dizer – Eu até esperava por essa resposta sabe Rubens. Queria te dizer que você tem exatos 24 segundo de vida. É o tempo até bater no chão de cima do teto e morrer... Se eu calculei direito claro.
Não consegui dizer tudo em sequência perfeitamente, já que ele gritava e berrava durante o meu discurso de valorização à vida. Eu via assim. Ele não. Talvez o leitor também não, mas só talvez. E de “talvezes” não se faz o conhecimento empírico, certo? Ele deveria escrever a própria história e escolheu assim.
- Você ainda tem uma chance. Te vejo em 23 segundos. Até... – Fui largando pouco a pouco até deixá-lo cair no chão.
Vi novamente o medo em seus olhos e tive certeza. Aquele medo só é possível quando ainda temos algo com o que nos importar em vida. Por mais que fosse inútil, ou que muitas pessoas julgassem fútil, ele ainda se importava. E aquilo era muito importante pra mim. Assisti ele cair em cima do próprio braço e ouvi o barulho do braço partindo. Não me arrependi nem por um segundo já que não tinha tempo. Desci correndo e o encontrei sem poder respirar. Rubens usava só uma das mãos para levar até o pescoço e tinha lágrimas em seus olhos.
Olhei para o relógio. Abaixei até bem próximo do seu ouvido e disse mais veloz:
- Pisque os olhos duas vezes se sim. Você ama sua vida?
Rubens fechou os olhos uma vez. Lágrimas desceram nesse momento. Eu podia sentir a sua dor, mas não sentia. Queria que aprendesse. Ele fechou os olhos mais uma vez. Garoto esperto. Esse era o código. Ajudei-o com o braço quebrado e pressionei seu peito contra o chão algumas vezes para que voltasse a respirar. Quando voltou ele gritou:
- Socorro! Alguém! Por favor – Extremamente óbvio.
Eu sussurrei:
- Agora você tem 24 minutos. Nos encontramos no Hospital. – Disse assim mesmo.
Ele gritava e chorava por causa do braço. Era preciso sentir alguma dor. Correto? Para dar valor em todos os momentos em que não sente nada e em que a vida também dava uma trégua. Diferente daquele Abril. Chovia muito no caminho para o hospital. Chovia demais e dentro do carro de sua mãe ele ainda parecia desesperado. Eu estava ao seu lado e já fazia 10 minutos que saímos da casa, até o posto hospitalar rural mais perto, era no mínimo mais 10 minutos. A mãe repetia que ele não iria morrer. Eu ficava calado. De propósito. Só porque sabia que aquilo lhe inspiraria um pouco de pânico.
Vinte minutos. Tempo exato. Rose – mãe de Rubens – E do outro R, Roberto, teve um pouco de dificuldade para tirá-lo do carro. A chuva atrapalhou um pouco também. Ele nervoso. Ela nervosa. Fatalmente deixaram o doutor José Xavier muito nervoso. Era um sujeito normalmente tranquilo e por isso escolhera a profissão.
Rubens desmaiou. Rapidamente o doutor imobilizou o braço e colocou as talas ao redor. Percebeu que esse era o único problema com o garoto e o deixou descansando enquanto José checava os outros pacientes.
Exatos 24 minutos. Entrei na sala. Próximo a seu leito estava um copo de plástico com água e tampado. Ele dormia sem preocupações. Ou talvez as tivesse e eu só não enxergava pela serenidade que aparentava enquanto dormia. Peguei o copo e retirei a tampa. Com um cuidado contraditório lancei algumas gotas sobre o rosto de Rubens. E disse com certa urgência na voz, que é bem difícil fazer em momentos como esse:
- Acorda garoto... Já descansou e já passou um tempo pra pensar. Rose está lá fora e o seu Doutor também, mas ninguém vai entrar aqui e nos interromper... Juro.
Ele acordou e ao ouvir minha voz e as palavras que disse foi tentando reorganizar os pensamentos até perceber que o terror já tinha tomado seus olhos ao ponto que eu pudesse perceber. Notei e peguei em seu braço quebrado. Não era necessário muito. Era só mover um pouco para qualquer lado e a gritaria iria começar. Isso se eu não tampasse sua boca e dissesse que ao ouvir um só murmúrio iria desistir de sua lição e partir para o momento da punição. Ele pareceu concordar em lágrimas.
- Você tem dez segundos para me dizer.
- Aarrgh... O que? Por favor... O que?
Disse então sem perder a paciência:
- Você ama sua vida?
- Eu posso ser... aarrgh... Sincero na resposta... Como sempre, não é mesmo? – Disse com a dor estampada em sua face.
- Sempre, meu menino. Você sabe que é especial. – Sincero.
- Eu não sei até que ponto eu amo minha vida, mas sei que não decidi morrer. Ainda não. Preciso de... aaii... Tempo. É isso. Tempo pra descobrir. Mais do que esses sei lá quantos minutos.
- Você entendeu o jogo. 24 dias. Eu irei esperar 24 dias pela sua resposta e te encontrarei naquela árvore cortada abaixo do campo de futebol no lado oeste daquela cidadezinha deprimente.
- Ok. Eu irei. Promessa. Só me faz um último favor. Para de me chamar de garoto, estou ficando velho pra isso. – Eu já tinha soltado seu braço e as reclamações pararam. Em tese.
- Irei pensar no assunto. Se você me provar que merece eu paro. Garoto – Disse já virando as costas e seguindo em direção à porta. O médico abriu a porta e eu saí com o pescoço erguido, e como já imaginava, nenhuma palavra. Passei por Rose e segurei seu ombro por alguns segundos sem dizer nenhuma palavra. Depois parti.
Nesses 24 dias Rubens fez exatamente o que eu esperava. Ficou mais tempo sozinho sem se maldizer na maior parte do tempo. Reclamava menos do que era lhe pedido, apesar de não aceitar que tudo estava sempre bem. Eu via essas ações com certo orgulho, seu braço melhorou rápido e ainda existia rebeldia em sua existência. Ele passou bem mais tempo lendo e ainda mais se desconcentrando das leituras e perdendo seus olhos no horizonte.
Era um bom sinal.
Pelo menos a meu ver e de acordo com meus objetivos com Rubens. No dia marcado, 24 depois do encontro no hospital e da pergunta sem resposta esperei por Rubens desde bem cedo na árvore. A polícia ainda passou procurando alguma coisa e percebi que aquela era a primeira vez que via homens fardados por aquela área. Provavelmente não veria nunca mais. Durante a tarde resolvi juntar cem pedras ao redor da árvore cortada. Aquilo deu mais trabalho do que eu imagina e foi bem inútil, diga-se de passagem. Ia anoitecer. Eu ainda esperava sentado na árvore. O sol descendo, despedindo-se do céu. E aquele garoto vinha andando com ar de quem sabe das coisas. Sabe das coisas da vida e das respostas do mundo, mas ainda não se importa com as perguntas.
Ele veio calmamente em minha direção. Fiquei até meio envergonhado pelo último encontro, mas sabia que era necessário. Ele continuou calado até sentar-se ao meu lado. Não olhávamos um para o outro. Não era preciso.
Esperávamos o sol nos deixar a sós para conversar.
Quando ele se foi, pensei em não fazer nenhum cumprimento sem significado real e decidi perguntar o essencial.
- Você ama sua vida?
- Não – disse sem pensar nem um segundo na resposta. Sem hesitar.
Devo admitir que me surpreendi. Acreditei que os dias lhe trariam o conhecimento que lhe faltava sobre a vida. Acontece que ainda não sabia se era temor. Ou mesmo desprezo.
- Então assim que vai ser? Posso te matar agora? Veja bem... Eu só quero te ajudar. Terminar isso com um pouco mais de honra e menos sujeira que um suicídio no seu quarto. Rose teria um infarto. Talvez.
- Olha. Não amo minha vida. Não gosta das coisas da forma como acontecem, mas acontece que eu sou pequeno. Desprezível, sabe? Não tenho autoridade para tirar uma vida agora. Nem mesmo a minha. Sou ainda um garoto. Verdadeiramente ainda sou muito moleque para resolver minhas questões, meus problemas. Mas acho que com o tempo posso superar muito disso. Por esse motivo e alguns outros que eu não sei como te contar, explicar de uma forma que não pareça uma loucura qualquer, não posso morrer aqui. Não posso morrer hoje e nem deixar que me mate. Nossa... Foi difícil dizer... E quase não respirei. – Eu percebi na segunda frase que ele disparava as palavras sem se preocupar com o que eu fosse dizer em seguida.
Eu podia matá-lo e ele sabia disso. Mesmo assim parecia querer compartilhar seu pensamento. E eu não tinha nenhuma escolha diferente de respeitar sua opinião. Senti-me envergonhado pela segunda vez. Talvez a segunda vez que me lembro desde sempre.
Eu disse sem pensar. Também talvez a única vez desde sempre:
- Rubens... – Ele arregalou os olhos em minha direção esperando que eu dissesse “Garoto” me corrigindo. Eu não fiz o que ele esperava e ainda não entendo meus motivos. Foi pura força do momento mesmo. No momento a gente não pondera. Faz, age e espera um sorriso do lado de lá. – Eu até consigo entender um pouco, mas você sabe o que te espera. Aproveite a vida que você deve viver. 24 anos. Nosso encontro será aqui nesse mesmo lugar. Não importa em que buraco e nem em que país você esteja escondido. Venha aqui para uma última conversa. Irei ouvir algo sobre você nesse meio tempo, mas não farei nada para impedir.
- Obrigado. – Ele ia começar a chorar e não queria ver o garoto de novo.
Nos 24 anos que passei distante eu ouvi muitas coisas. Algumas boas e outras ruins. Uma perda material importante. Um carro batido e até mesmo um incêndio. Acontece que muito de bom veio também. Rose ainda continuava ao seu lado. Agora ainda ajudava a cuidar de Vitor. Filho de Rubens e Luana. Ele a fez muito feliz nesse tempo e foi feliz a seu lado também. Não sei se esperava por algo assim ou não. Trabalhou muito e recompôs toda a perda que teve. Deu boa educação a Vitor. Da maneira que deveria ser e do modo como foi com ele. Criou 6 gatos e 2 cachorros. Chorou na morte de todos. Vitor chorou junto dele com um gato que chegou a conhecer. Conseguiu promoções e ajudou alguns poucos amigos que colecionou durante sua vida. Não foi injusto e se manteve longe de qualquer confusão nesse tempo. No dia de sua viagem à árvore despediu-se de sua mulher e filho de forma calorosa.
Ele sabia.
Eu o esperava. Sabia que como da última vez tinha chegado ao anoitecer, chegaria dessa vez ao amanhecer. O ritual sempre se segue há séculos. Assim, ainda no frio escuro da madrugada eu esperava o sol se apresentar. A lua sempre se despedia após garantir que ele tinha chegado. Ela permanecia mais clara depois que ele chegava e aos poucos desaparecia. Antes de o sol surgir eu o vi andando pela mesma direção que veio 24 anos antes. Ele parecia mais altivo que dá última vez. Ele conhecia mais segredos do que antes. Mais respostas e pareceu dedicar tempo às perguntas.
Seu andar era mais vagaroso, de forma que chegou à árvore enquanto o sol ascendia. Acendia sua chama tardia. Ele parecia bem mais velho que seus 46 anos. Sentou-se com dificuldade.
- Droga... – Ele disse sem me cumprimentar – perdi a parte mais divertida. Correto?
- Meu caro... Cada dia nasce e morre de forma diferente... Contemplar um mínimo que seja desse momento esplendoroso já é dádiva de poucos. Nunca saberemos qual será o último... Ou ao saber, dedicamos todo o valor necessário a esse nascer-morrer... Entende?
- Entendo. Pois, agora mesmo me concentro como nunca nesse nascer-morrer... Eu sei por que estou aqui. – Disse com pesar na voz.
- Você ama sua vida? – A última pergunta se fez por minha voz sem mesmo eu chamá-la.
- Mais do que qualquer coisa nesse universo. Nessa galáxia. Nessa infinidade estúpida. – Sincero.
Eu senti que ele já sabia. E ficava cada vez mais difícil passar a mensagem.
- Foi muito bom te conhecer... Filho. – A segunda vez que seus olhos brilharam arregalados.
Ele juntou coragem e perguntou:
- Pai... Como você morreu?
Eu suspirei. Pensei talvez. E fui mais uma vez sincero:
- Da mesma forma como você morrerá hoje. Da mesma forma que meu avô morreu. Que Vitor vai morrer. E o filho dele também. Talvez seja uma filha. Dará ainda mais trabalho e de todo modo. Está em nosso sangue.
- Pai... Vai chover quando eu morrer? – Ele já chorava. Como quando era Garoto.
- Você quer que chova? – Perguntei me segurando ainda.
- Quero... “Rain when I die” – Sussurrou a canção que eu já sabia a qual banda pertencia. Sempre foi assim.
- Eu sou a Morte. Faço o que for preciso. Você também será em instantes e então eu estarei livre. Tudo o que lhe ensinei, em verdade ou em sonho, você deverá transmitir. Proteger seu pupilo e nunca deixa deixar a linha ser cortada. Assim o universo funciona. Assim sempre funcionou. As raças mudam. As imagens que eles têm de nós, mas nós nunca mudamos. Somos só imortais que se cansam de viver. Vampiros buscando o torpor. Lobisomens escondidos da grande cidade má. Fadas do outro lado véu. Velhos loucos disfarçados de filósofos.
- Entendo. – Disse conformado.
Levantei a mão contra Rubens e toquei sua fronte. Ele fechou os olhos e esperou um golpe. Um corte. Algo que lhe machucasse e tirasse sua alma dali. Nada disso aconteceu. Eu retirei levemente a essência de vida que existia no velho-garoto. Ele agora estava frente a frente comigo e seu corpo estendido sem vida na árvore cortada.
- Fique tranquilo. Isso acontece da mesma forma desde... Sempre. Eu cuidarei de Luana, Rose e Vitor também – Eu disse ao pai de Rubens antes de tocar em sua fronte imaterial e continuar – Você pode descansar agora, já matou gente demais. Eu sou a morte agora. Esse é meu dever.
Um velho carregava um carrinho de supermercado cheio de latas de refrigerante recolhidas pela rua. Junto das latas havia também um cobertor gelado. Tinha sido uma noite difícil e estava cada vez mais difícil andar. Sentiu um arrepio pela espinha e procurou pela corrente de ar ao seu redor. Não encontrou nada. Como sabia que não iria encontrar. Só olhou à esquerda e viu a árvore cortada. Um homem deitado. Morto? Será? O velho pensou em conferir, coçou os olhos e já não via ninguém.
Nunca comentou com ninguém.
Morreu com um grande sorriso. Três dias depois.
Alexandre Bernardo
XX
And if the sun refuse to shine?
Let's move on
A cigana de fogo (Ato 1)
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1813
Europa ocidental
Voltava pra casa após mais um dia de trabalho nada incomum
Distante eu vi uma fogueira
Um povo estranho em volta dela dançando e can...
Há 4 anos